O mito do Multitasking

6 Mar 2019

Atender o telefone, enquanto se faz o jantar. Falar com o marido ou mulher, enquanto se ajuda o filho com os trabalhos de casa. Estar no meio de uma conversa importante, ao mesmo tempo que responde rapidamente a uma mensagem/email que acabou de entrar. Espreitar as notificações, no meio de uma reunião. Atender um cliente, enquanto se responde a uma mensagem de um colega que acabou de entrar. Escrever um recado, enquanto se espreita o Instagram ou o Facebook. Certamente, terá muitos outros exemplos para acrescentar…

Isto mostra-nos a vida acelerada e atarefada que todos temos: a partilha da atenção por mil e uma coisas. Uma competência que parece que fomos treinando e que até acreditamos que conseguimos gerir. Mas a verdade é que não conseguimos, não é possível.

Quando o tema é multitasking, não podemos deixar de lado a responsabilidade que temos enquanto pais, educadores. Quantos de nós, fica com o telemóvel ao lado, enquanto brinca ou estuda com os filhos, desviando a atenção plena daquele momento, sempre que entra uma notificação, que na maioria das vezes nem tem qualquer importância. À semelhança das tarefas apontadas anteriormente, é essencial viver o aqui e o agora. Dar valor ao que estamos a fazer e a viver, para que o nosso cérebro não entre em curto circuito e se desligue do que realmente é importante naquele momento. Não é fácil, certamente, mas não é impossível. Treinamos o corpo para sermos mais saudáveis, porque não fazer o mesmo com cérebro para que se “dedique” ao que está a tomar a sua atenção.

Herbert Simon, cientista cognitivo, diz-nos que aquilo que a informação consome é a atenção. Quanto mais informação temos ao mesmo tempo, mais pobre é a nossa atenção para cada uma das tarefas.

Segundo o psicólogo Daniel Goleman, o cérebro não presta atenção a várias tarefas ao mesmo tempo, fazendo com que o nosso cérebro mude de uma tarefa para a outra. Há uma alternância. É uma ação em série e não em paralelo. Até aqui tudo bem, o problema é que de cada vez que desviamos a atenção para outra tarefa, mesmo que por alguns segundos, quando voltamos à mesma, já perdemos parte da concentração. Se o que interrompemos exigia muita atenção, a tarefa sairá prejudicada ou demoraremos mais tempo para recuperar o mesmo nível de atenção e completar o que estávamos a fazer. Se a quem estávamos a dar atenção era a uma pessoa, a mensagem que transmitimos, enquanto desviamos a atenção para verificar uma notificação, é de indiferença - Phubbing (palavra inventada para descrever o ato de ignorar o outro por prestar atenção ao dispositivo electrónico).

O prejuízo do multitasking - mais do que uma tarefa ao mesmo tempo - é transversal às várias áreas da nossa vida. Tornamo-nos incapazes para filtrar o “ruído” (as mil distrações) do sinal (aquilo a que pretendemos prestar atenção). Cria confusão sobre o que é verdadeiramente importante para nós. 

Algumas pessoas vão defendendo que conseguem efetivamente fazer várias tarefas em simultâneo, mas um grupo de cientistas da Universidade de Stanford descobriu que estas pessoas têm é menor capacidade de manter o foco da atenção numa dada tarefa. Analisando a atividade cerebral destas pessoas quando se tentam focar numa só tarefa, os cientistas verificaram que os seus cérebros continuam a disparar ação em várias áreas corticais, o que indica distração.

A boa notícia é que o controlo cognitivo é passível de ser treinado, levando progressivamente a uma maior capacidade de focar a atenção e resistir às distrações.

Marco Clemente